Sermão da Festa da Santíssima TrindadeO mistério da Santíssima Trindade, a vida de oração e a fecundidade da Igreja

Bendita seja a Santíssima Trindade.

(Introito da Missa, na Festa da Santíssima Trindade)

Em nome do Pai e do Filho + e do Espírito Santo. Amém.

Ave Maria…

Se formos consultar o que os Padres da Igreja e os antigos teólogos pensam do dogma da Santíssima Trindade, eles dirão que embora seja uma verdade muito obscura, ela tem máxima importância. Nas palavras de Santo Hilário, que foi bispo de Poitier, na França, “este mistério é conhecido pela Igreja, não é aceito pela Sinagoga, é ignorado pelos filósofos” (De Trinitate, l. VIII). É a verdade fundamental que nos discerne dos judeus e dos pagãos. Nossa inteligência criada, com suas próprias forças, é absolutamente incapaz de conhecer este mistério, que é essencialmente sobrenatural e, sem uma revelação de Deus, nunca teríamos o conhecimento explícito da vida interior de Deus, tal como ela é em si mesma.

É o caso, então, de nos perguntarmos: que motivo levou Deus a nos fazer conhecer uma verdade sobre Ele mesmo e que é incompreensível à nossa inteligência? É como se Deus tivesse aberto a porta de sua casa pessoal e nos tivesse feito olhar dentro dela, para nos mostrar como é a sua vida mais interior e íntima. Mais que isso: é como se Ele tivesse se rasgado ao meio, para nos fazer ver dentro do seu ser. Por que motivo Deus quis fazer isso?

É comum ouvir que o mistério da Santíssima Trindade é um enigma sem qualquer interesse para nossa vida interior. Nada mais falso.

Santo Tomás nos faz conhecer um pouco melhor como em um só Deus há três Pessoas realmente distintas, fazendo um paralelo com o conhecimento e o amor humano.

Deus tem inteligência e vontade. Deus se conhece e, assim, concebe uma idéia de si mesmo. Se esta idéia que Deus tem de Si mesmo fosse menor do que Deus, Deus seria ignorante, pois Ele não se conheceria perfeitamente. Isso é inaceitável. Se a idéia que Deus faz de si mesmo fosse maior do que Ele, Deus seria orgulhoso, o que é um absurdo também. Além disso, nada pode ser maior do que Deus, nem podemos conceber nada de maior, além de Deus. E Deus se conhece perfeitamente, tal como Ele é. A idéia que Deus tem de si mesmo é exatamente como Ele é. A consequência é enorme: essa idéia que Deus tem de si mesmo é Ele, e se é verdade que quanto melhor conhecemos uma coisa, mais a idéia que temos dela fica unida à nossa inteligência, então a idéia que Deus tem de si mesmo é perfeitamente unida a Ele, porque Ele se conhece perfeitamente. E o amor que Deus tem por si mesmo é tão grande como Ele é: é infinito. Ora, só Deus é infinito, e este Amor de Deus, portanto, é Deus.

A idéia que Deus concebe de si mesmo é a 2a. Pessoa da Santíssima Trindade, e o Amor infinito de Deus é o Espírito Santo.

Deste modo, ao conhecermos o que “acontece”, por assim dizer, dentro de Deus, aparece diante de nós a fecundidade infinita e eterna da natureza divina, que é comunicada ao Filho pelo Pai, e que também é comunicada ao Espírito Santo pelo Pai e pelo Filho.

Neste mistério, Deus nos faz conhecer o que é a vida intelectual mais perfeita que existe, e da qual procede a vida de amor mais perfeita que existe: a dele mesmo. Essas considerações não são nem um pouco teóricas, simplesmente, sem qualquer consequência prática na nossa vida.

Porque se é verdade que toda vida vem de Deus, porque tudo o que existe veio dele, então só é possível haver uma vida católica fecunda, com geração de virtudes em nós e de boas obras, com conversões, etc, na medida em que nossa vida for mais e mais semelhante à vida que Deus tem em si mesmo, e que é tão fecunda que gera uma pessoa divina, e que nos permite dizer “Deus de Deus, luz da luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro (…) E no Espírito Santo, Senhor e vivificador, que procede do Pai e do Filho“. Nossa vida só poderá ser fecunda na medida em que for semelhante à vida de Deus, porque só a vida de Deus é maximamente fecunda, e é dela que tudo o mais que tem vida recebe vida e fecundidade.

E se a vida de Deus é conhecer-se e amar-se, e é isso que o torna tão fecundo, nós só seremos fecundos se pensarmos constantemente em Deus, e o amarmos constantemente. E isso se faz na oração.

É um erro enorme se enganar, pensando que produziremos resultados na Igreja sem que nossa vida seja como a vida de Deus. Sem muita oração, nada de sério é gerado na Igreja. Todos os grandes doutores foram grandes contemplativos, e tiveram um enorme interesse não somente pelas coisas práticas da vida humana, mas também em se dedicar a contemplar a vida íntima de Deus, isto é, o mistério da Santíssima Trindade, por exemplo Santo Agostinho, Santo Atanásio e Santo Tomás de Aquino. Todos eles foram pessoas que rezavam muito, se preocupavam muito em conhecer profundamente quem é Deus, e se dedicaram muito a servir na salvação das almas, agindo na vida concreta das pessoas, nas suas paróquias, dioceses, regiões em que estavam, dando soluções concretas para suas dificuldades concretas.

A fecundidade de Santo Agostinho, por exemplo, é imensa. Escreveu livros há mais de 1600 anos, mas que continuam sendo estudados em universidades, mesmo laicas, e que continuam fazendo bem para as pessoas ainda hoje, que ao ler o que Santo Agostinho escreveu, passam a ter uma vida melhor.

Sem bastante oração, sem conhecimento e amor de Deus — que só se dá de verdade na vida de oração — nós nunca produziremos nada de sólido e de fecundo na nossa vida, porque toda fecundidade vem de Deus, e nele isso se dá pelo conhecimento e pelo amor que Ele tem de si mesmo. E assim, e somente assim, seremos fecundos em boas obras e louvor a Deus.

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