A história de José do Egito

Disponibilizaremos, quinzenalmente, aos nossos leitores, os apontamentos que resumem os comentários à Sagrada Escritura, dados na Paróquia São Paulo Apóstolo. Esperamos, assim, que aqueles que se vêem impossibilitados de frequentar presencialmente as aulas na paróquia possam, em certa medida, tirar proveito do conteúdo que é oferecido.

Os comentários à Sagrada Escritura ocorrem todas as quintas-feiras, das 20h00 às 21h00, na paróquia. As pessoas interessadas em assistir só precisam comparecer, sem necessidade de pagar qualquer taxa de inscrição ou mensalidade.

Bibliografia básica :

1) La Sainte Bible, La Genèse et Introduction au Pentateuque, Ed.Lethielleux, Paris, 1895.

2) P. Cornelius a Lapide, S.J., Commentaria in Scripturam Sacram, t. I, Ed. Ludovicus Vivès, Paris, 1874.

3) Pirot-Clamer, La Sainte Bible, t. I, p. 1, Genèse, Letouzey et Ané, Paris, 1953.

Gênesis XXXVII

v.2 – Eis a história de Jacó. José tinha dezessete anos. Ele apascentava o rebanho com seus irmãos, — era jovem, — com os filhos de Bala e os filhos de Zelfa, mulheres de seu pai, e José contou a seu pai o mal que deles se dizia”.

Será contada a história de Jacó como patriarca e chefe de família.

Neste primeiro versículo temos resumidamente os passos que tomarão toda a vida de José com seus irmãos.

Bala era a serva de Raquel, e adotou os filhos dela, os que Jacó mais estimava.

Jacó coloca José junto dos filhos de Raquel, para educá-lo à vida de pastor. Aqui, todos os irmãos estão reunidos e, por isso, José acaba junto com os outros irmãos.

José, em consciência, conta ao pai o mau comportamento dos irmãos, para que o pai possa dar remédio ao que está acontecendo.

o mal que deles se dizia” – o comportamento deles já era causa de escândalo no lugar em que viviam. Pelo modo como é contado, dá a entender que os irmãos escondiam cuidadosamente de José o que faziam, porque ele era bom e, não sem incômodo, sabiam que não concordaria com o que faziam.

Em latim: “crimine pessimo” – Os comentadores (S. Tomás de Aquino, Ruperto, Hugo de São Vitor) dizem que se trata aqui de um pecado contra a castidade. Como é algo horrível e vergonhoso, a Sagrada Escritura não entra em detalhes e se contenta com uma referência sumária da questão.

De onde se vê como não é boa coisa que se expliquem questões de castidade, em público, com detalhes, por meio de conferências públicas ou artigos e gravações na internet, acessíveis a todos, entrando em detalhes específicos e casos particulares que devem ser explicados para as pessoas em particular, de acordo com as necessidades de cada um, na medida em que cada um precisa. Infelizmente, é comum encontrar sites na internet, até mesmo católicos, que tratam de certos problemas específicos de castidade, inclusive com imagens inconvenientes, ou que fazem alusões mais ou menos implícitas a certas coisas, etc., ou até mesmo explícitas demais, colocando temas delicados ao acesso fácil de qualquer pessoa, indistintamente. Esta prática sempre foi criticada pela pastoral constante da Igreja, repreendida pelos bispos e pelos Papas. E a própria Sagrada Escritura nos dá exemplo de como falar dessas coisas em público, quando e se for necessário: com máxima discrição.

A encíclica Divini illius Magistri, de Pio XI, denuncia “essa iniciação temerária e essa instrução preventiva dada a todos indistintamente, e mesmo publicamente”. O que é visado não é nem a iniciação nem a instrução sexual, mas a iniciação temerária, inconsiderada, perigosa; dada a todos indistintamente, isto é, sem levar em conta o desenvolvimento psicológico das crianças e de suas necessidades reais. E como não há duas almas que se encontrem no mesmo estado, com as mesmas necessidades, compreendemos que mal pode fazer essa iniciação temerária dada a todos indistintamente. E publicamente, o que levará à perda do pudor necessário para que essa educação seja proveitosa.

Daqui se pode ver também como é possível que um pai preocupado em servir bem a Deus procure dar aos filhos uma educação religiosa séria e fazer que seus filhos sirvam a Deus, mas ver que seus esforços são estéreis pela má vontade deles. Podemos dar aos outros que queremos e/ou devemos ajudar todo o bem que está ao nosso alcance, mas o resultado final dependerá da pessoa ajudada. Cada um é, finalmente, totalmente responsável pelas suas próprias escolhas.

v.3 – Israel amava mais a José do que a todos os seus outros filhos, porque ele era o filho de sua velhice, e mandou fazer-lhe uma túnica adornada”.

Além disso, era filho da sua esposa mais estimada. Via nele os traços e qualidades dela.

Benjamim também era filho dela, e mais novo ainda, mas aqui só tinha 1 ano.

Normalmente, a túnica era sem mangas e descia até os joelhos. Mas José usa um modelo usado pelas pessoas mais nobres, com mangas e que desce até os pés. É o sentido dado no v. 23. Na verdade, ela tem as duas qualidades: vai até os punhos e calcanhares, e é colorida.

Vê-se que seu pai manifestava visivelmente toda a estima que lhe tinha.

uma túnica adornada Em grego (Septuaginta) e latim (Vulgata): χιτών ποιϰίλος, tunica polymita, túnica de cores diversas.

Aqui podemos ver como no Oriente ainda se tingem fios para tecer, e como são vendidos nos mercados.

E uma espécie de caracol que, pelas cores da sua concha, recebeu dos biólogos o nome de polymita! 

 

 

 

 

 

 

 

v.4 – Seus irmãos viram que seu pai o amava mais do que a todos os seus outros filhos e odiaram-no e se tornaram incapazes de lhe falar amigavelmente”.

Os irmãos de José concebem ódio por ele, por causa da virtude pessoal que tinha e estima que recebia do pai. Só lhe respondiam de modo irritado e desagradável.

A presença dos bons basta para irritar os maus. A vida virtuosa dos bons deixa claro que, de fato, é possível realmente praticar a virtude, e isso mostra aos maus que eles não têm desculpas para justificar a má vida que levam. Como o problema deles não é a ignorância do que é certo e errado, mas a má vontade, não querem mudar de comportamento, e passam a perseguir os bons: “Cerquemos o justo, porque ele nos incomoda; é contrário às nossas ações; ele nos censura por violar a lei e nos acusa de contrarias a nossa educação” (Sabedoria, 2, 12).

v.5-7 – Ora, José teve um sonho e o contou a seus irmãos, que o odiaram mais ainda. Ele lhes disse: Ouvi o sonho que eu tive: pareceu-me que estávamos atando feixes nos campos, e eis que o meu feixe se levantou e ficou de pé, e vossos feixes o rodearam e se prostraram diante de meu feixe”.

Em hebreu, no original: “Ouvi o sonho que eu tive: E eis que que estávamos atando feixes nos campos, e eis que o meu feixe se levantou e ficou de pé, e eis que vossos feixes o rodearam e se prostraram diante de meu feixe”. Há várias manifestações de espanto: “e eis que…”, repetido várias vezes. Isso mostra que José ficou muito impressionado com o que sonhou e que vê um presságio de algo grande. José tem a alma reta e sem malícia, e conta a história para seus irmãos com muito entusiasmo, mas com toda boa vontade, sem querer provocá-los.

v.8 – Seus irmãos lhe responderam: Queres acaso governar-nos como rei ou dominar-nos como senhor? E eles o odiaram ainda mais, por causa de seus sonhos e de suas intenções”.

v.9-11 – Ele teve ainda um outro sonho, que contou a seus irmãos. Ele disse: Tive ainda um outro sonho: pareceu-me que o sol, a lua e onze estrelas se prostravam diante de mim. Ele narrou isso a seu pai e seus irmãos, mas seu pai o repreendeu, dizendo: Que sonho é esse que tiveste? Iríamos nós então, eu, tua mãe e teus irmãos, prostrar-nos por terra diante de ti? Seus irmãos ficaram com ciúmes dele, mas seu pai conservou o fato na memória”.

Existe uma clara manifestação de uma futura glória. Que Raquel esteja morta, isso não compromete o sonho no seu significado.

Jacó estima que seu filho é levado pela presunção e pela ambição; quer atenuar os maus efeitos que vê nos irmãos de José.

José, na sua inocência, não vê a má reação dos irmãos.

vv. 12-14 – Seus irmãos foram apascentar o rebanho de seu pai em Siquém. Israel disse a José: Não apascentam teus ir mãos o rebanho em Siquém? Vem, vou enviar-te a eles. E ele respondeu: Eis-me aqui. Ele lhe disse: Vai então ver como estão teus irmãos e o rebanho e traze-me notícias. Ele o enviou do vale de Hebron e José chegou a Siquém”.

Jacó não envia mais José junto com os irmãos, por causa das rixas que tinham surgido e porque teme que o mau exemplo deles lhe faça mal.

Agora, passado um tempo, crê que os irmãos já não tem mais rancores e o envia, achando que será recebido sem maiores problemas.

vv. 15-18 – Um homem o encontrou andando errante pelos campos e este homem lhe perguntou: Que procuras? Ele respondeu: Procuro meus irmãos. Indica-me, por favor, onde apascentam seus rebanhos. O homem disse: Eles levantaram acampamento daqui; eu os ouvi dizer: Vamos a Dotain. José partiu à procura de seus irmãos e os encontrou em Dotain”.

Dotain tinha uma fonte e o lugar era mais verde, melhor para fazer os animais pastarem.

18-20 – Eles o viram de longe e, antes que chegasse perto, tramaram sua morte. Disseram entre si: Eis que chega o tal sonhador! Vinde, matemo-lo, joguemo-lo numa cisterna qualquer; diremos que um animal feroz o devorou. Veremos o que acontecerá com seus sonhos!”.

A cólera deles continua, e já de longe o vêem. Têm muito desprezo por ele. É a antipatia própria das pessoas que vivem mal e que não suportam ver quem vive de modo honesto. A palavra em hebreu usada aqui para “cisterna” significa literalmente “buraco”. Eles não têm mais nenhuma estima pelo irmão nem temor de Deus.

21-22 – “Mas Rúben, ouvindo isso, salvou-o de suas mãos. Ele disse: Não lhe tiremos a vida! Disse-lhes Rúben: Não derrameis o sangue! Lançai-o nesta cisterna do deserto, mas não ponhais a mão sobre ele! Era para salvá-lo das mãos deles e restituí-lo a seu pai”.

Livrou-o no sentido de que foi impedido de ser morto, e queria levá-lo a seu pai, finalmente.

Rúben usa o plural, para que seus irmãos não suspeitassem de seus planos, lhes dando a impressão de que planejava junto com eles todos.

Essas cisternas tinham a entrada estreita e as pareces internas inclinadas. Quem caísse dentro não conseguia sair sozinho.

23-24 – Assim, quando José chegou junto deles, despojaram-no de sua túnica, a túnica adornada que ele vestia. Arremessaram-se contra ele e o lançaram na cisterna; era uma cisterna vazia, onde não havia água”.

Muitas cisternas ficavam secas no verão, mas continuavam com lama no fundo e úmidas, o que tornava a permanência muito penosa. Seu estado de alma era certamente angustiante.

25 – Depois sentaram-se para comer. Erguendo os olhos, eis que viram uma caravana de ismaelitas que vinha de Galaad. Seus camelos estavam carregados de alcatira, de bálsamo e ládano que levavam para o Egito”.

Alcatira (do árabe al-catira) (Astragalus gummifer) é uma planta de que se extrai uma goma clara com mesmo nome. É um pequeno arbusto da Pérsia e do Curdistão, de um a dois metros de altura. A goma que se recolhia dela era usada na medicina (as folhas também) e como cosmético. Os gregos a chamavam de adragacanto, literalmente “espinho de bode”.

 

A resina sempre teve importância  na vida econômica do Egito. Era usada para fazer unguentos que limpavam a pele, proteger do sol e combater o mau cheiro do corpo. Era queimada no culto aos deuses. Combatia os vermes e os insetos e era usada na mumificação.

O ládano é uma resina que vem de uma rosa selvagem. No Egito era usado como incenso nos templos e casas. Também tingia os cabelos brancos e combatia a queda deles, e aliviava as dores.

O Egito comprava esses produtos, e muitas vezes tentou produzi-los internamente.

Depois sentaram-se para comer. Erguendo os olhos, eis que viram uma caravana de ismaelitas (…)” – Apesar da aparente calma, o fato de terem visto de longe a caravana mostra que estavam inquietos.

26-27 – Então disse Judá a seus irmãos: De que nos aproveita matar nosso irmão e cobrir seu sangue? Vinde, vendamo-lo aos ismaelitas, mas não ponhamos a mão sobre ele: é nosso irmão, da mesma carne que nós. E seus irmãos o ouviram”.

Judá vê na circunstância uma vantagem: afastar definitivamente José de lá e propõe que seja vendido como escravo.

28 – Quando passaram os mercadores madianitas, eles retiraram José da cisterna. Venderam José aos ismaelitas por vinte siclos de prata e estes o conduziram ao Egito”.

O preço de um escravo era de 30 siclos: “Se o boi ferir um escravo ou uma serva, dar-se-ão trinta siclos de prata ao senhor destes, e o boi será apedrejado” (Êxodo 21, 32). [Evidentemente esta lei é posterior a história de José, pois foi redigida por Moisés. Mas que essa lei tenha sido escrita depois, não significa que tenha inventado uma regra inexistente antes. Muito provavelmente ela só fixou por escrito um costume já existente muito tempo antes].

Houve uma negociação, para que os ismaelitas o comprassem barato e pudessem lucrar mais na venda final. Além disso, o que os irmãos de José queriam mesmo era se livrar dele.

O texto nos mostra que os comerciantes aproveitavam de ocasiões para traficar escravos.

Os escravos eram distintos dos servos. Estes ficavam ligados à terra e quando ela era vendida, eles iam com ela. Mas não tinham a liberdade limitada por outras restrições. Os egípcios geralmente os obtinham pela guerra, frequentemente com países do nordeste. Passavam a ser propriedade do rei, que fazia o que queria depois: vendia, dava às oficinas e templos, ou deixava que os soldados os guardassem. Assim, pessoas de classe social modesta às vezes possuíam escravos.

Os papiros indicam que muitos escravos vinham da Palestina. O termo egípcio para “escravo” vinha da palavra egípcia usada para se referir à “Palestina”. Nas listas de escravos que chegaram até nós, em papiro egípcio, a maioria tem nomes semíticos. A chegada de José no Egito foi mais um fato banal no contexto egípcio.

29 – Quando Rúben voltou à cisterna, eis que José não estava mais ali. Ele rasgou suas vestes”.

Rúben não estava com eles provavelmente porque estava angustiado e não podia sentar e comer. Além disso, deve ter buscado a solidão para pensar em um plano melhor.

30-31 – e, voltando a seus irmãos, disse: O rapaz não está mais lá! E eu, aonde irei? Eles tomaram a túnica de José e, degolando um bode, molharam a túnica no sangue”.

Manifesta um vivo sentimento de dor e a responsabilidade que tem como irmão mais velho diante de José e de seu pai.

32-33 – Enviaram a túnica adornada, fizeram-na levar a seu pai com estas palavras: Eis o que encontramos! Vê se é ou não a túnica de teu filho. Ele olhou e disse: É a túnica de meu filho! Um animal feroz, o devorou. José foi despedaçado!”.

José foi despedaçado!”. – A estrutura do texto hebreu dá o sentido de total certeza da parte de Jacó.

34 – Jacó rasgou suas vestes, cingiu os seus rins com um pano de saco e fez luto por seu filho durante muito tempo”.

Entre os hebreus era um ato que simbolizava luto, exteriorizando a dor que era sentida na alma.

Esta pano de saco era uma veste rude e feita de pele de cabra ou de camelo, era estreito e tinha a forma de um saco.

“(…) durante muito tempo” – por 23 anos, até saber que José estava vivo no Egito.

35 – Todos os seus filhos e filhas vieram para consolá-lo, mas ele recusou toda consolação e disse: Não, é em luto que descerei ao Sheol para junto do meu filho. E seu pai o chorou”.

Alguns pensam que Jacó tinha outras filhas além de Dina; mas o termo filhas pode ter sido usado para suas noras.

É espantoso que Rubem não tenha contado a verdade ao seu pai, e o tenha deixado nesse estado.

Ele recusa consolo dizendo: “Meu luto só terminará quando eu morrer e for enterrado e o ver novamente na mansão dos mortos”. Ele certamente se culpava por ter feito a José um pedido que o expôs a esse perigo. Pensa no fato de que, se não tivesse pedido a José que fosse ver seus irmão, ele estaria vivo.

Jacó afirma, com isso, a imortalidade da alma – contra muitos exegetas modernos que, atualmente, defendem a tese de que os hebreus tinham uma noção materialista da alma e não acreditavam na sua imortalidade.

36 – Entretanto os madianitas venderam-no, no Egito, a Putifar, eunuco do Faraó e comandante dos guardas” .

Putifar era um nome comum no Egito. De acordo com Champollion, sua forma egípcia era Petephre. É assim que a Septuaginta transcreve: Πετεφρῆς. Significa “consagrado a Phra”, o deus-sol.

eunuco do Faraó e comandante dos guardas” – Havia muitos eunucos no Oriente e eles ocupavam as posições oficiais mais altas. Eles comandam as tropas nas guerras, recebem os prisioneiros e as cabeças dos mortos depois da batalha.

Apesar de receber o nome de eunuco, Putifar era casado.

É possível que o termo não deva ser tomado no primeiro sentido que tem. É muito provável que os hebreus tivessem estendido este nome a todos os grandes oficiais das cortes. Os caldeus usavam o termo para os sátrapas.

Mas há a possibilidade de que ele fosse um eunuco casado. Há um romance egípcio com um personagem assim.

comandante dos guardas” – Esses guardas eram um conjunto de soldados que protegiam o faraó e que executavam as ordens que ele dava. Eles se encarregavam da prisão do Estado. O mestre de José eram um grande oficial da corte.

O que podemos tirar como primeira lição deste capítulo é:

  1. Deus faz com que aqueles que Ele ama passem por perseguições e dificuldades para crescerem em virtude.
  2. Foi certamente a mansidão com que sofreu todas essas dificuldades que o ajudaram, com a graça, a guardar a pureza quando foi tentado pela esposa de Putifar, de acordo com aquilo que Nosso Senhor diz: “Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a terra”. Vencem as rebeldias da carne aqueles que domaram os ímpetos da alma. Além disso, quem mantém a calma e as paixões tranquilas quando passa por dificuldades acaba vencendo as tentações com muito mais facilidade. O pior modo de se comportar diante das tentações é entrar em pânico…

A história de José é um desenvolvimento da profecia de Gênesis 3, 14 onde Deus coloca inimizades entre os filhos da serpente e os filhos da mulher. Esse princípio, estabelecido e anunciado por Deus nos primeiros capítulos da Sagrada Escritura, será desenvolvido e explicitado cada vez mais ao longo de toda a Sagrada Escritura, com Cain e Abel, Noé e as pessoas com quem vivia, Sodoma e Gomorra, José e seus irmãos, etc., até chegarmos em Jesus Cristo e os judeus que o perseguiram e mataram. E ao longo de toda a história do mundo veremos estes mesmos princípios se realizando, na vida de cada um de nós, em nossas famílias, em nossas paróquias, em nosso trabalho, na Igreja Católica (“o Reino dos céus é como uma rede que pega peixes bons e maus”), etc.

Em toda esta história de José nos é ensinado como é que os filhos de Deus devem se comportar. Ela nos mostra o que é um filho de Deus, o que é ser filho de Deus e como ele deve se colocar diante de tudo o mais.

Ele é um filho de Jacó que foi salvo finalmente e se torna salvador dos outros filhos de Jacó. Isso se dá porque ele passou pela morte e voltou à vida: “José, meu filho, ainda está vivo!”, dirá Jacó no final. Este é o resumo da vida de José.

Ele tem uma sabedoria que é profética porque vem de Deus. Decifra os sonhos por uma sabedoria recebida de Deus: “Visto que Deus te fez saber tudo isso, não há ninguém tão inteligente e sábio como tu”. O faraó atestará a sabedoria de José.

Esta sabedoria de José, vinda de Deus, é uma sabedoria que faz com que ele faça uso de uma palavra verdadeira. Jacó sempre dirá a verdade. Dirá a verdade para os dois homens que estavam presos com ele no Egito, mesmo tendo que dizer a um deles que morrerá ao final. Dirá a verdade ao faraó, mesmo se é necessário dizer que o Egito passará dificuldade e será necessário fazer sacrifícios para armazenar comida antes da seca futura. José sempre fala a verdade, ainda que ela não seja agradável, mas o faz com tranquilidade, para o bem de quem a ouve.

Nós vimos que a família de Jacó é uma família moralmente doente, particularmente no uso da palavra:

Seus irmãos (…) se tornaram incapazes de lhe falar em paz”. Além disso, os filhos de Jacó mentem para o pai. É uma família que tem graves problemas. É uma palavra movida pelo ódio, eles se odeiam, inspirada pelo desejo do dinheiro: “Vinde, vendamo-lo aos ismaelitas”.

Uma palavra mentirosa e assassina: “Vinde, matemo-lo, joguemo-lo numa cisterna qualquer; diremos que um animal feroz o devorou”. Os irmãos de José são, por enquanto, filhos da serpente. No paraíso, a serpente teve um discurso mentiroso e homicida. Disse aos nossos primeiros pais uma mentira, para fazê-los pecar, e a consequência disso foi a morte para eles e todos nós, física e da alma.

José não age assim. Ele diz o que deve dizer. Diz aos dois servos do faraó a verdade. Não dissimula ao faraó o que acontecerá ao Egito. E Deus o recompensa por isso.

Ele faz uma espécie de terapia da palavra e, ao final de tudo, levará seus irmãos a falar com verdade e a reconhecer a verdade: o que haviam feito com ele, com o pai deles, o pecado deles.

É um filho sábio e que conduz os outros à sabedoria.

Nosso primeiro pai, Adão foi criado e lhe foi dada a sabedoria. Porém, com todos os privilégios que tinha, os dons preternaturais, a profunda vida espiritual que tinha, pecou e perdeu a sabedoria. Fica, então, a seguinte pergunta:

Se nosso primeiro pai, em todas estas circunstâncias, pecou e perdeu a sabedoria, será possível aos homens voltar a adquiri-la? É possível ao homem, depois do pecado original, chegar à verdadeira sabedoria?

Todo o livro do Gênesis, iniciando com um homem que era sábio e perdeu a sabedoria (Adão) e chegando até José, será um percurso na aquisição da verdadeira sabedoria, e uma resposta a esta pergunta, na pessoa de José do Egito. Deus não abandonou o homem e pela sua Providência procura fazer com que cada pessoa adquira ainda nesta vida a sabedoria que Ele dá a todo homem que não endurece o coração.

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