Sermão da Solenidade da AscensãoA união com Deus no Céu

E as portas da cidade serão conforme os nomes das tribos de Israel; três portas para o norte: a porta de Rúben uma, a porta de Judá outra, a porta de Levi outra.

(Ezequiel 48, 31)

Em nome do Pai, e do Filho, + e do Espírito Santo. Amém.

Ave Maria…

Quando comemoramos a Ascensão de Nosso Senhor, é claro que o assunto mais adequado de nosso sermão só pode ser o Céu. E no livro do Apocalipse está escrito que Deus mostrou a São João Apóstolo uma visão do Céu, da Jerusalém celeste. Ela tinha uma muralha de quatro lados, e três portas em cada lado da muralha, e em cada uma das portas estava escrito o nome de uma das tribos de Israel: “E tinha um grande e alto muro com doze portas, e nas portas doze anjos, e nomes escritos sobre elas, que são os nomes das doze tribos dos filhos de Israel” (Apoc. 21, 12).

Ainda não entramos na Jerusalém celeste, e estamos do lado de fora das suas muralhas. Mas se, por enquanto, não podemos entrar nela, podemos nos contentar em olhar para suas portas, e tentar deduzir um pouco, pelos nomes que estão escritos sobre cada porta desta Cidade celeste, o que encontraremos lá dentro, como se ao refletir sobre cada título de uma de suas portas olhássemos, na verdade, pelo estreito buraco de cada uma das suas fechaduras. Infelizmente o tempo é curto, o que nos obriga, aqui, a olhar por uma fechadura só.

Uma das portas da sua muralha tem o nome de Levi que, em hebreu, significa unido com alguma coisa ou com alguém. Enfim, sabemos que no Céu todos estão unidos com Deus, e por causa disso cada anjo e cada santo está unido com todos, e todos com cada um. No Céu, cada alma que se salvou é tomada por Deus para se unir a Ele. Acontecerá conosco algo semelhante ao que aconteceu com a alma de Cristo nesta vida, que estava unida à divindade, na unidade de uma só Pessoa, a 2a. Pessoa da Ssma. Trindade. É verdade que não será uma união tão estreita como a que havia em Cristo. Não estaremos unidos a Deus para formarmos com ele uma só pessoa. Mas essa união será mais ampla.

Em Jesus Cristo, uma só natureza humana individual foi unida à Pessoa do Verbo. No Céu, todas as almas estarão unidas a Deus. Em Jesus Cristo, só a 2a. Pessoa da Ssma. Trindade se uniu a uma alma humana. No Céu, todas as almas estarão unidas às três Pessoas da Ssma. Trindade. E essa união de todas as almas com Deus será indissolúvel, como a divindade de Cristo nunca mais se separará da sua humanidade. Reflitamos um pouco, e veremos como não é possível esperar nada de mais grandioso que Deus nos pudesse dar. Por quê?

Porque estar unido assim a Deus é ter a felicidade que Deus tem consigo mesmo. O que faz Deus infinitamente feliz é o conhecimento que Ele tem de si mesmo, e o amor que Ele tem de si mesmo. E quando Deus nos unir a Ele, diretamente, conheceremos Deus, e amaremos a Deus, como Deus se conhece e se ama. E, assim, a felicidade que teremos é a mesma felicidade que Deus tem consigo mesmo. E essa felicidade é infinita. O conhecimento de Deus, por toda a eternidade, não será algo monótono. Basta considerar que tudo, absolutamente tudo que existe neste mundo e que pode nos interessar, saiu de Deus, recebeu sua bondade de Deus, e é infinitamente menos do que Deus.

Os bens sobrenaturais em si mesmos ultrapassam os bens naturais. São de uma natureza superior. O conhecimento e o amor sobrenaturais ultrapassam o conjunto do conhecimento e do amor natural que se pode ter das criaturas. Pelo conhecimento de uma só verdade sobrenatural, temos um conhecimento que ultrapassa toda capacidade natural da inteligência, e pela caridade amamos a Deus por cima de tudo nesta vida. E isso se aplica maximamente ao conhecimento e ao amor que teremos de Deus no Céu. Por causa disso, a alegria sobrenatural que teremos no Céu, mais do que entrar na alma que a tem, é antes a alma que entra nessa alegria: “Entra na alegria do teu senhor” (S. Mateus 25, 21-23).

Agora, se os santos e anjos estão todos unidos com Deus, se segue que estão todos unidos entre si. E daqui nasce que a glória de todos é a glória de cada um. E, assim, cada santo é feliz com sua própria glória, mas também com a glória de todos. Não somente porque é o mesmo Deus que faz cada um feliz, mas porque todos se amam tanto entre si, que cada um fica feliz com a glória dos outros, como se fosse a própria.

Neste mundo, a felicidade de uma pessoa não costuma ser a felicidade dos outros. Antes, costuma ser sua inveja, e seu medo de perdê-la, porque os bens desta vida são limitados, e combatem entre si, e o amor dos homens entre si costuma ser por interesse próprio, e não de verdadeira caridade, interessada na salvação das almas. Porém, no Céu, onde Deus é nosso bem infinito e a caridade é verdadeira, a felicidade de cada santo é a de todos, e a de todos é a de cada um. E sendo o número dos santos e dos anjos simplesmente incalculável, qual será o tamanho da felicidade que cada um terá no Céu?! No Céu, cada alma é como um espelho, sobre a qual Deus brilha, e ao fazê-lo, reflete em todas as outras, e assim sem fim. Quanta luz tem no Céu!

Enquanto não passamos por esta porta, que devemos fazer? Procurar que os outros conheçam a Deus e o amem sobre qualquer coisa desta vida, procurando a salvação de todos. Estimar isso mais do que nosso próprio interesse, e estimar a salvação dos outros como se fosse a nossa própria salvação. Isso será começar a ter nesta vida a felicidade da outra, unidos a Deus por estarmos com sua graça na alma e, por isso, unidos uns aos outros. E que seja assim até a glória eterna.

Em nome do Pai, e do Filho, + e do Espírito Santo. Amém.

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